Viajar, dar a conhecer outras terras e outras gentes é um
propósito meritório e generoso, que todos devíamos apoiar. Foi a pensar nesta
medida de longo alcance e vistas largas, visando aumentar o alfobre eleitoral
que a Companhia Do Unto (CDU), tem promovido, vezes sem conta e muitas vezes
sem dar conta a quem devia, inúmeras viagens por esse país e até pelo
estrangeiro, pagas com o dinheiro do erário público.
Ainda estou lembrado de que, no início do passado ano e
antes que a “torneira” pudesse fechar, o Centro Social e Cultural dos
Trabalhadores do Município de Nisa pediu, não uma, mas cinco viagens no
“autocarro do conhecimento”, duas delas de dois dias.
A Câmara, perdão, a Companhia Do Unto, acedeu a tão justo
pedido, contrariando, o que aprovara para vigorar como regulamento, mensagem
que, ainda hoje, curiosamente, continua a passar em rodapé no site do
município.
Em Outubro de 2005, poucos dias passados sobre a vitória
eleitoral da CDU para a Câmara, o autocarro lá foi, em viagem de prece e
agradecimento, a Fátima, numa deslocação e utilização da viatura que ninguém
assumiu ter autorizado, isto, apesar de os vereadores da oposição terem pedido,
vezes sem conta, esclarecimentos sobre o assunto.
Durante o período que antecedeu as eleições de 2009, muitas
centenas de nisenses de todo o concelho, puderam organizar, a seu bel-prazer,
viagens aos mais exóticos sítios e destinos, aproveitando as benesses que o
tempo pré-eleitoral sempre concede.
Isto, num concelho dos mais envelhecidos do país e da
Europa, onde a população das aldeias não tem direito a transporte público
diário e regular para a sede do concelho, sujeitando-se a pagar do seu bolso e
das pensões de miséria que recebe, as viagens para aceder a diversos serviços,
entre eles o da prestação de cuidados de saúde.
É uma situação vergonhosa e ao mesmo tempo dramática,
esbanjar, por um lado, recursos em viagens turísticas de longa duração,
substituindo-se às agências de viagens para esse efeito constituídas e, por
outro, limitar ou mesmo negar o direito a um bem que é prioritário e elementar,
para uma população carenciada, que tem de pagar um preço acrescido pelo
isolamento a que está votada.
Soubemos, agora, que o “autocarro do conhecimento” se
deslocou a Montemor-o-Velho em complemento de serviço fúnebre, transportando
pessoas da ADN e outras.
Não está em causa, o sentimento nem a homenagem que essas
pessoas quiseram prestar ao falecido pai do director executivo da ADN.
Todos nós temos familiares e pessoas amigas espalhadas pelo
país e pelo mundo.
Mas, será que, da próxima vez que falecer um amigo ou
familiar em Azay le Rideau, Tours, Lisboa, Faro ou Póvoa de Lanhoso, também
posso pedir o “autocarro do conhecimento”, sem custos, e levar a vizinhança
comigo?
A população das nossas aldeias não tem direito ao
transporte, mas sobram iniciativas, viagens, dinheiro mal gasto, numa Companhia
Do Unto que está com a "corda na garganta" e asfixiada
financeiramente, fruto dos devaneios políticos em que tem embarcado, ao longo
destes anos.
É bem verdade, como canta o Paco Bandeira: “quando o mar
bate nas rochas quem se lixa (f...) é o mexilhão”. Neste caso, o povo.
Mário Mendes - 5/1/2010